sexta-feira, 26 de abril de 2013

Apresento-lhes o Senhor S.

A personalidade e a memória, tópicos de destaque da psicologia, sempre foram abordados de uma forma quantitativa, cartesiana e científica. A preocupação de se afirmar a psicologia como uma ciência, fez com que vários pesquisadores tratassem de temas altamente complexos e multidimensionais de forma limitada, considerando só o que poderia ser visto, observado e experimentado e, assim, criando regras gerais.

Alguns pesquisadores e estudiosos, como Descartes e Freud, quebraram este estilo de abordagem, criando o estudo de caso, que consistiria em analisar caso por caso, sem comparações, chegando a um resultado específico para as particularidades de cada circunstância. Buscam, também, analisar o homem como um todo, levando em consideração o contexto em que se insere. Além disso, a linguagem da pesquisa deveria se dar de forma simplificada, acessível ao leitor.

Assim, na década de 20, o pesquisador russo A. R. Luria, inspirado nos ideais de Descartes, começa a estudar psicologia, especializando-se em memória. Em seu livro "A Mente e a Memória", Luria nos conta a história de um jovem repórter que, um dia, bate em seu laboratório pedindo-lhe que teste sua memória. O homem - chamado Sherashevsky (S.) - não entendia o que tinha de diferente, mas, seu chefe o havia mandado fazer uma análise, pois o considerava especial.

S. no seu primeiro relato contou como tinha facilidade para lembrar as coisas. Poderia descrever com uma precisão incrível cenas de anos passados! S. conseguia lembrar de situações que ele vivenciou quando  era apenas um bebe! Luria tinha certeza que estava na frente de um estudo de caso extraordinário! Em um primeiro teste de memória, o psicólogo leu uma série de palavras, algumas com nexo, outras sem sentido, aumentando a quantidade gradualmente, e o S. conseguiu reproduzi-las tranquilamente, sem errar ou pular uma!!

Com outros testes, Luria percebeu que não se tratava de medir a capacidade da memória de S., pois esta  era imensurável, mas de se questionar outras coisas. Qual seria o efeito desta memória extraordinária na construção da personalidade de S.? 
"Que mudanças ocorrem no mundo interno de uma pessoa, no seu relacionamento com os outros, no seu próprio estilo de vida quando um elemento de sua constituição psíquica, sua memória, desenvolve-se num grau tão excepcional que começa a alterar todos os outros aspectos de sua atividade?" (LURIA, pg 4)
 Luria então inicia uma jornada de estudo que duraria 30 anos, acompanhando S. de perto e analisando os efeitos desta super-memória em sua vida. Vamos contar aqui no blog ao decorrer de mais dois posts a vida de S. e os estudos de Luria! Você não vai perder, vai?

Para quem quiser se inteirar mais e ler o livro de Luria (recomendo muito!) o nome é "A Mente e a Memoria" - A. R. Luria - editora Martins Fontes.


sábado, 13 de abril de 2013

Além dos sentidos!

É um árduo mundo para aqueles que não têm as ferramentas necessárias para enfrentá-lo. O nosso maior mecanismo, o corpo, pode ser dúbio, mal interpretado, deficiente ou falho. Os cinco sentidos combinados (e até mesmo quem sabe um sexto) nos ajudam a formar as percepções do mundo; mas e aqueles em que um dos sentidos é deficiente? Ou até mesmo naqueles em que, momentaneamente, o sentido falha, engana? Não é pouco poder confiar apenas no corpo?

Em um artigo da New Scientist, o jornalista Mark Shrope expõe a descoberta dos psicólogos Frank Geldard e Carl Sherrick que, ao tentar descobrir como as sensações táteis da pele eram interpretadas pelo cérebro, usando uma série de vibradores conectados a um gerador de sinais, acabaram descobrindo um fenômeno que se assemelhava a ilusão de ótica, mas no âmbito da pele, do tato.

Esta ilusão ficou conhecida como "coelho cutâneo" e serviu de inspiração para outros estudos do tato. Ao perceber a relação direta entre a pele e o cérebro, e como o toque é extremante estimulante e faz com que o cérebro responda rapidamente, o psicólogo Roger Cholewiack se especializou na elaboração de um macacão tátil, no qual os vibradores, posteriormente evoluídos para tatores pneumáticos, emitiriam estímulos na pele fazendo com que o corpo respondesse instintivamente.

Estes tatores pneumáticos possuem mil e uma utilidades. Ajudar pilotos, condutores ou motoristas desorientados, por exemplo:
"quando o helicóptero se inclina para frente, fortes vibrações na frente do traje praticamente forçam o piloto a corrigir a posição. Derivar para um lado causa vibração na lateral do macacão. (...) A resposta instintiva a cada um desses estímulos é a correta: a reação automática é a de corrigir movimentos involuntários." (SHROPE, 2001)
 Outra possibilidade de uso dos tatores (e mais incrível ainda, na minha opinião) seria a de permitir que surdos possam sentir a música. A vibração dos tatores criaria uma ilusão de tato, na qual a música se tornaria algo palpável, e assim, eles poderiam literalmente sentir a música!

Ainda pensando nos tatores como garantia de acessibilidade, deficientes visuais se beneficiariam colocando os sensores em uma bengala ou na roupa, dando-lhes maior noção espacial e orientação.

Resumindo, os tatores pneumáticos podem oferecer uma melhoria na qualidade de vida de todo mundo! Sem exceção!! Com seu uso cotidiano, o benefício seria geral!!

Quem quiser ler a matéria do Mark Shrope pode acessar este link: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1706200101.htm